Talvez nenhum outro continente do mundo tenha exercido tanto fascínio para os europeus, como a América. No século XVI, ela alimentava a fantasia dos homens com seus mitos e promessas de ouro. Para os ingleses, que viam os espanhois tomarem posse deste enigmático território, opnavam que outras nações também deveriam explorá-lo. Um desses homens foi Walter Raleigh (1552-1618), almirante e espadachim; traficante e pirata; corsário e colonizador; filósofo e poeta; conspirador e historiador; estadista habilidoso e alquimista requintado; sonhador e aventureiro. Foi um dos primeiros a propagar o fumo do tabaco, presenteado aos amigos juntamente com cachimbos de prata. g5u6t
Raleigh veio de uma familia abastada. Ainda jovem, seduzido pela carreira militar, entra em contato com as descrições literárias de soldados que retornam das Américas, falando de um paraíso repleto de tesouros e cidades perdidas. Aos 28 anos de idade, desperta o interesse da rainha Elizabeth I, que estava interessada em formar um grupo de corsários e que facilitou a organização de expedições colonizadoras (entre 1582 e 1587) na Carolina do Norte (EUA), sob seu comando. O fracasso dessas expedições e o envolvimento amoroso do corsário com a Dama de Honra de Elizabeth, o levaram à prisão na sombria Torre de Londres. Mas Raleigh, num golpe de sorte, conseguiu comprar sua liberdade graças ao patrocínio que havia feito de uma expedição pirata, onde obteve um enorme lucro com o saque do galeão espanhol Madre de Deus.
Livre momentaneamente das grades, parte atrás de um sonho que o perseguia há anos: o mito do El Dorado, uma cidade construída em ouro, situada nas florestas da América do Sul. A frota de Raleigh parte em fevereiro de 1595, com cinco embarcações e 100 soldados. Em Trinidad, apodera-se da cidade de San José, e faz prisioneiro seu governador Antonio de Berrio, um homem igualmente apaixonado e perturbado pelo mito do El Dorado. Raleigh e sua tripulação sobem o rio Orinoco, mas as doenças tropicais os destroem; e o retorno humilhante a Londres serve apenas para rebaixar sua imagem.
Embora desprezado pela corte, Raleigh possuía forte patriotismo e habilidades diplomáticas invejáveis! Consegue assim, embarcar em junho de 1596 na frota para combater a Invencível Armada de Filipe II, soberano espanhol odiado pelos ingleses. A vitória trás novo prestígio ao pirata, que é agraciado com o título de Governador da cidade de Jersey. Contudo, com a morte da rainha Elizabeth I em 1603 e a subida ao poder de Jaime I – que não simpatizava com Raleigh pelo seu ado como pirata – levou-o mais uma vez à prisão. Desta vez, a acusação recaiu sobre um suposto envolvimento em um complô contra o rei.
Em sua cela, Raleigh dedica-se a escrever. Produz o primeiro (e único) volume de sua “History of World”, com 1360 páginas. Escreve várias poesias, dissertações, e monta um completo laboratório para a prática da alquimia, onde (supostamente) descobre uma fórmula para transformar água salgada em potável, e um bálsamo capaz de aliviar e curar as mais terríveis dores. Contudo, sua obra mais famosa, pela qual seria conhecido futuramente é “Discovery of the large, rich and Beautiful Empire of Guiana, with a relation of the Great and Golden city of Manoa (which the Spaniards call El Dorado)”, escrita quando de sua primeira viagem a Guiana. O velho pirata, com 65 anos, faz então sua última tentativa de auto promoção. Consegue propor ao soberano uma segunda viagem de conquista ao El Dorado, para estabeler uma colônia inglesa na América.
Após 13 anos na masmorra, Raleigh é solto em liberdade condicional, sob a promessa de não praticar pirataria contra os espanhóis, agora aliados da coroa inglesa. Em 1617, segue em direção à Guiana e Orinoco, com 14 navios e mais de 2000 soldados. Desobedecendo ordens de seu rei, Raleigh ocupa Trinidad e Santo Tomé (Guiana), matando os espanhóis residentes. A expedição em busca do El Dorado torna-se um fracasso retumbante, e Raleigh é abandonado pela própria tripulação.
Em 21 de junho de 1618, de volta a Plymouth, derrotado e abandonado, é acusado de pirataria e tem sua sentença finalmente decretada. Como Cavaleiro da corte, teve ainda um último pedido atendido, o de ser decapitado, já que o enforcamento era destinado a pessoas infiéis e indígnas. Assim, em 29 de outubro de 1618, morria Walter Raleigh, e com ele um dos períodos mais prósperos para a pirataria inglesa.
Dalton Delfini Maziero é historiador, escritor, especialista em arqueologia e explorador. Pesquisador dos povos pré-colombianos e história da pirataria marítima. Visite a Página do Escritor (clique aqui)